domingo, 24 de março de 2013

Com a Palavra por Edson Liberato Edição Especial


Os Incompreendidos
 por Edson Liberato



“Les Quatre Cents Coups”

Ano - 1959

Produção Direção e Roteiro – François Truffaut

Elenco:
Jean – Pierre Léaud – Antoine Doinel
Claire Maurier – Gilberte Doinel
Albert Rémy – Julien Doinel
Patrick Auffay – René
Guy Decomble – Professor

Estreia na França – junho de 1959
Estreia no Brasil – abril de 1962

Prêmio de Melhor Direção no Festival de Cannes
Indicação à Palma de Ouro do Festival de Cannes
Indicação ao Oscar de Melhor Roteiro Original
Indicações de Melhor Filme e Ator Revelação (Jean-Pierre Léaud) no Bafta
Melhor Filme do Sindicato dos críticos de Cinema da França
Melhor Filme Estrangeiro no Círculo de Críticos de Cinema de Nova York





     Em 1959, os jovens estudantes universitários discutiam os livros e as peças de Samuel Becket, ouviam jazz e liam nos jornais sobre a morte de Billie Holiday, o existencialismo de Jean-Paul Sartre e Albert Camus era o pensamento vigente, enquanto o cinema iniciava a Nouvelle Vague. 


     A expressão lançada por Françoise Giroud, na revista L’ Express, designava uma nova maneira de fazer cinema na França. O gênero valorizava os aspectos psicológicos dos personagens, em relação às questões cotidianas e banais, com a intenção de tratar os assuntos de maneira realista, com referências de literatura e cinema. A Nouvelle Vague teve a sua estreia com “Nas Garras do Vício” de Claude Chabrol, em 1958, já no ano seguinte se consagrava com “Acossado” de Jean Luc Godard, e “Os Incompreendidos” de François Truffaut. O primeiro longa metragem de Truffaut foi um grande sucesso de público e crítica. O jovem diretor, de apenas 28 anos, teve a sua consagração no Festival de Cannes com o prêmio de melhor direção. O filme é dedicado a André Bazin, que morreu aos 40 anos de leucemia, um dia após o início das gravações.




     “Era bom viver antes da morte de André Bazin. Eu corava de orgulho quando, durante uma discussão, ele dava sua aprovação. Mas eu sentia um prazer ainda maior quando ele discordava de mim. Ele era o justo, por quem gostávamos de ser julgados. Para mim, era um pai do qual as críticas eram suaves, como o testemunho de um interesse afetivo do qual, enquanto criança, fui privado.”
(Truffaut, “Cahiers du Cinéma” 91, 1959)

     André Bazin era crítico e teórico de cinema, foi um dos mentores da Nouvelle Vague, editor-chefe e um dos fundadores do Cahier du Cinema, em 1951. A objetividade que é encontrada nas obras de Truffaut  teve o incentivo de Bazin. 





     A vida de Truffaut aproxima-se muito do seu personagem Antoine Doinel. Sem conhecer seu pai biológico e rejeitado pela mãe, Truffaut foi criado por seus avós até os 10 anos, quando sua avó faleceu. A mãe do garoto, que estava casada, o acolheu. Sem receber atenção em casa e com um desempenho escolar ruim, Truffaut passou a cometer pequenos delitos. Aos 15 anos abandonou os estudos e tornou-se assíduo frequentador de um clube de cinema. Nesse meio conheceu André Bazin.

     O letreiro do filme é apresentado enquanto a câmera percorre as ruas de Paris, e a Torre Eiffel aparece e some constantemente por detrás dos prédios. Em seguida o personagem principal é mostrado na escola sendo punido pelo professor por mexer com material impróprio durante a avaliação. O professor repreende a turma e mostra que não acredita em seus alunos afirmando em tom de ironia: “como será bela a França daqui a dez anos.” Em casa Antoine Doinel, interpretado por Jean Pierre Léaud, é visto como um incomodo por seus pais. No dia seguinte o garoto encontra um colega no caminho da escola e não assiste à aula. Os dois andam pela cidade, jogam pinball, vão ao parque de diversões e em uma esquina Doinel vê sua mãe beijando um homem e logo comenta com seu colega que poderia arranjar um dinheiro fácil de noite. 




     O filme mostra as deficiências da escola e da família perante a uma sociedade com normas que não estão de acordo com a realidade. Antoine Doinel, que tem 14 anos, não se encaixa nos padrões estabelecidos e passa a perambular pelas ruas de madrugada, quando foge da casa dos seus pais. Os acontecimentos não são apresentados com dramaticidade, até mesmo quando o garoto chora por estar sendo mandado para um reformatório, o que se vê são apenas lágrimas sendo enxugadas no rosto, sem grandes ares de tristeza. O garoto não é um herói, mas também não é um vilão, os espectadores não torcem por ele, mas também não o censuram, seus delitos não são certos, mas também não são condenáveis. “Os Incompreendidos” não tem a intenção de passar nenhuma lição de moral, o filme apenas demonstra as coisas banais da vida em um roteiro simples e bem escrito. Acredito que Camus e Sartre gostaram. Até a próxima edição!!!

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